Não desperdice o tempo do leitor
“A pessoa não ouve o que a outra fala. Ouve da fala dela apenas aqueles pontos que possam fazer sentido para as ideias e pontos de vista que no momento a estejam influenciando ou tocando mais diretamente”.
Artur da Távola
Diga o que o leitor precisa saber
Saber o que dizer é passo importante para quem deseja se comunicar com sucesso. Lembre-se: se as ideias não estão suficientemente claras, espere um pouco até que amadureçam.
Não comece a escrever sem ter claramente definido o objetivo de sua comunicação.
A pior coisa do mundo é deixar para o leitor a difícil tarefa de se encontrar em meio a caminhos desencontrados, só porque você não se organizou direito e, simplesmente, esqueceu de ensiná-lo a achar a trilha certa para sair desse labirinto de ideias aparentemente desconexas.
Todo esforço no sentido de fazê-lo não perder tempo será recompensado. Em contrapartida, se o leitor perceber que você está divagando, o risco passa a ser enorme: ou o leitor renuncia à tarefa de decifrar o enigma – e, simplesmente, abandona o jogo – ou envereda por uma trilha secundária – e fica inteiramente perdido – ou então percorre o caminho do jeito dele – e a compreensão fica aquém do resultado que você gostaria de obter.
Em todos os casos, a comunicação será sempre a maior prejudicada. E comunicação equivocada significa desperdício de tempo e dinheiro – e muito trabalho dobrado.
Se a folha de papel ou a tela do Word persistem em continuar em branco, pergunte a si mesmo: o que realmente eu quero dizer?
Se você tem que informar, informe; se tem que comunicar, comunique; se tem que avisar, avise. Mas, diga isso no primeiro parágrafo. Fuja dos abomináveis tendo em vista que, ou considerando que, aos quais, invariavelmente, se segue muita delonga e conversa inútil.
Sendo direto e objetivo, você permite ao leitor decidir se vale a pena ou não prosseguir na leitura do texto.
Observe:
Para: John Porter
CC: Ann Muller
Assunto : Abono de faltas.
São Paulo, 18 de junho de 2013.
Senhor Gerente,
Solicitamos abonar as faltas dos colaboradores Leonardo Graça Mello e Rafael Kramer, que não puderam comparecer ao Treinamento de Elaboração de relatórios e pareceres, realizado nos dias 26 e 27 de agosto, no núcleo de MBA da Universidade José Saramago.
A ausência dos dois se deve à não liberação pela Gerência de Seguros, envolvida full-time no processo de elaboração dos demonstrativos anuais da Companhia.
Estamos à inteira disposição para qualquer esclarecimento adicional que se fizer necessário.
Cordialmente,
MAX GORDON
Gerente de RH
Claro que essa estratégia diz respeito à geração de cartas, e-mails e demais papers corporativos. Evidente que o esquema proposto não contempla outros tipos de produção textual.
Nas fábulas, por exemplo, a narrativa é forjada mediante a construção de diálogos, travados entre personagens que representam uma alegoria do mundo real. Por meio do clássico era uma vez, o leitor será conduzido a um universo mágico de tapetes voadores e varinhas de condão, onde bruxas e duendes, princesas, animais falantes e rainhas más transitam entre palácios mágicos, florestas encantadas e casas feitas de doce e de chocolate.
A construção de sentido se dá, quando, ao final do texto, a moral da estória, o dito esclarecedor, se revela. Há sempre um ensinamento a ser percebido, um modelo de comportamento a ser seguido – e isso só pode aparecer no final do texto.
O mesmo acontece na tragédia clássica, onde o leitor/espectador será conduzido à catarse, estado de sublimação e purificação, por meio do qual o autor dita um modelo de comportamento a ser observado, sem restrições. Caso contrário, a punição será tão terrível quanto aquela sofrida pelo infrator.
É interessante notar o papel representado na tragédia pelo coro, doze personagens conduzidas por um líder, denominado corifeu. O coro interfere no curso dos acontecimentos, antecipa enigmaticamente o final da estória e dá pistas sobre o que vai acontecer, o que só faz acentuar o clima de tensão e aumentar o mistério.
Édipo mata o pai, Laio, e se casa com a própria mãe, Jocasta – e sobre ele recairá a ira dos deuses. Seu pior castigo será o de cegar os próprios olhos, para que não possa, nunca mais, enxergar toda a maldade e destruição de que foi, inadvertidamente, o causador. Édipo, Laio, Jocasta – e o espectador, é claro – desconhecem o desfecho trágico de suas vidas. Mas o coro tudo sabe.
Nos romances policiais, o jogo de esconde-esconde se repete. A fórmula de sucesso da magistral Agatha Christie consiste em conseguir despistar o leitor, conduzindo-o, invariavelmente, a caminhos que não vão a lugar algum.
Se a vítima é a mulher de um marido violento – e muito ciumento – o mais provável é que o assassino seja mesmo esse marido violento e ciumento.
O segredo é despistar o leitor e desviá-lo da solução lógica e natural. De início, essa hipótese será descartada, e o leitor será conduzido a trilhas que resultam em hipóteses equivocadas. O cerne da discussão passa então a ser: qual dessas mulheres – todas com motivos e razões mais que suficientes para odiar a vítima – teria cometido o assassinato?
Quando, no final, a solução do conflito acontece e se revela a verdadeira identidade do assassino, é inevitável não virem à mente do leitor os seguintes pensamentos:
- Puxa vida! O assassino estava o tempo inteiro à minha frente e só eu é que não consegui ver.
- Mais uma vez a autora conseguiu me enganar. Como é que ela sempre consegue isso?
Esses e outros esquemas narrativos devem ser naturalmente descartados, se a proposta é a de se utilizar o texto como ferramenta de comunicação para a gestão de negócios.
Se o leitor deseja saber qual a melhor região para se instalar o novo call-center da Companhia, diga isso a ele nos primeiros parágrafos de seu texto. Nos parágrafos seguintes, fundamente sua opinião da forma mais objetiva possível. Apresente dados e informações pertinentes; acrescente detalhes; construa gráficos, tabelas e figuras ilustrativas; desenvolva argumentações favoráveis à sua proposta; reserve espaço, nos anexos e notas de rodapé de página para informações acessórias e recomende, ainda, as ações a serem executadas, caso sua proposta seja acolhida pela direção.
Mas diga logo ao leitor o que ele precisa saber.